sábado, 24 de dezembro de 2005

À Selene


Mãe dos ébrios, irmã dos loucos,
Fostes berço do infante Samael.
A ti dirijo meus gritos roucos
Tu que me serves no frio véu.

És a que é uma sendo quatro,
Reflexo da outra que se esconde,
Que à noite emoldura um triste quadro:
És o enterro daqueles que não tem onde!

Vejo-te, foice seca que traz a morte
Anunciada há tempos como vil prata!
A fronte afrontas, tal a crua sorte
Da noite em que vens anunciada.

Vejo-te quase, nem muito te encaro,
Fustigas-me em sofrimentos e me tenta.
O vão entorpecente que preparo
Não me permites tocá-la, mas alenta.

Não te vejo, nova, te evades.
És a fuga louca de minha autoria!
Nascestes outra em meus versos tardes
Choraste cedo ouvindo triste cantoria.

Vejo-me, em ti, em toda eu,
Deitas-me logo no colo enternecido.
Reflexo da minha alma que morreu,
Espelho de que fui sem ter o sido.